“Importa,
porém, caminhar hoje, amanhã e no dia seguinte, para que não suceda que morra
um profeta fora de Jerusalém”, respondeu Jesus aos fariseus, que lhe trouxeram
a notícia de que Herodes o queria matar (Lucas 13:33).
Porquê
a cruz? Esta é uma pergunta pertinente. Não foi por mim sugerida com o pretexto
de criar mais um tema para reflexão nesta época quaresmal, mas foi-me dirigida
por um amigo de muita estima. Não sei quais são os conceitos do leitor em
relação a todos os acontecimentos concernentes a Jesus no que diz respeito à
sua paixão e morte, mas há um facto que não podemos deixar de ponderar: o
carpinteiro de Nazaré tinha a ideia fixa de que ninguém o conseguia demover.
Antecipadamente começou a dizer aos seus discípulos que lhe “convinha ir a
Jerusalém e padecer muito dos anciãos, e dos principais dos sacerdotes, e dos
escribas, e ser morto”… (Mateus 16:21).
O
início do seu ministério foi em pequenas cidades e povoados, mas à medida que o
fim se aproximava o seu alvo principal incidia para a grande Jerusalém e, como
que atraído por um íman, dirigia-se sem vacilar para o local do seu suplício.
Terá Jesus sido vítima da sua própria ideologia e de uma sociedade corrupta em
que a religião servia mais os interesses dos homens do que a vontade de Deus?
Seria o Cristo tomado por sentimentos de masoquismo?
Poderá
ser que, por ignorância, pensemos coisas como estas ou outras do género, mas
também é natural que com o passar dos séculos se volte a questionar: porquê a
cruz? No passado ela foi usada como instrumento de suplício por vários povos da
antiguidade, como os Assírios, os Persas, os Fenícios, os Egípcios, Gregos e
Romanos. Posteriormente outros métodos foram usados, como por exemplo a forca,
a câmara de gás, a cadeira eléctrica, a injecção letal, etc, como forma de
castigar o mal, repor a justiça e a ordem para que as pessoas de bem pudessem
viver com o mínimo de segurança e tranquilidade. Hoje, nos países que se dizem
mais civilizados, apenas se atribui a prisão perpétua como pena máxima. O que
tem Jesus a ver com tudo isto, sendo ele o mais gentil de todos os homens?
Parece uma peça fora do puzzle, encaixada à força para preencher o vazio.
Porquê
a cruz? “Porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus…”
(Deuteronómio 21:23b). Cristo, o único ser vivo que nunca pecou, o próprio
Filho de Deus, foi considerado maldito? Porquê? O apóstolo Paulo, na sua carta
à igreja em Roma, diz: “Porque o salário do pecado é a morte…” (Romanos 6:23).
“Portanto, assim como por um só homem (Adão) entrou o pecado no mundo, e pelo
pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens porque todos
pecaram.” (Romanos 5:12). Se a história terminasse aqui estaríamos
irremediavelmente condenados, mas pela graça e misericórdia de Deus, Cristo
veio pagar o preço que nós não conseguiríamos pagar, oferecendo-se a Si mesmo
na cruz como sacrifício para resgate de todo aquele que nele crer. “Pois, assim
como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação,
assim também por um só acto de justiça veio a graça sobre todos os homens para
a justificação que dá vida. Porque, como pela desobediência de um só homem
muitos se tornaram pecadores, assim também por meio da obediência de um só muitos
se tornarão justos.” (Romanos 5:18, 19).
Quando
entro no meu quarto e contemplo o crucifixo, entristeço-me pensando: Senhor,
tudo isso padeceste por mim, em meu lugar. Fizeste-te mortal para que eu
pudesse viver eternamente.
Durante
o seu ministério, o Senhor Jesus sempre procurou sítios estratégicos como um
monte, uma praia ou um simples barquinho para se poder fazer ouvir e ser
perceptível aos seus ouvintes, mas, no entanto, para poder falar ao mundo
inteiro necessitou subir ao alto da cruz, símbolo de horror, dor e vergonha e,
para nós Cristãos, também símbolo da vitória de Cristo sobre o pecado e a
morte. Ela foi o palco da mais bela história de amor. Nem mesmo Romeu e
Julieta, que tanto têm inspirado jovens apaixonados, se pode equiparar ou
servir de ilustração do quanto Deus amou a humanidade, pois, desconhecendo o
poder do amor de Deus, que tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta, o
amor genuíno que nunca falha (1 Coríntios 13:7-8), puseram termo às suas vidas.
Mas Deus se apaixonou de tal maneira por uma humanidade que sempre andou de
costas voltadas para Ele, ao ponto de entregar à morte o seu único Filho, para
que todo aquele que nele crê não morra (espiritualmente), mas tenha a vida
eterna (João 3:16).
Se
a cruz falasse e pudesse expressar quanta angústia passou por ver o sofrimento,
sem sequer um lamento, de quem tanto nos amou, certamente perceberíamos quão
intenso e incondicional foi o amor de Deus pela coroa da sua criação. Do alto
da cruz, usando-a, qual tribuna, o Filho de Deus proferiu sinteticamente toda a
essência do seu ministério. Nem mesmo em meio a tanto sofrimento Ele baixou os
braços, sustentados por dois cravos junto a uma trave, ou perdeu a lucidez
sofrendo tamanha dor, mas, esquecendo-se de si próprio, cuidou com todo o
carinho de todos quantos estavam à sua volta. Aos seus carrascos e aos que dele
zombavam, disse: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem.” Ao malfeitor
que estava ao seu lado no mesmo suplício, confortou-o, dizendo: “Hoje estarás comigo
no paraíso.” À sua mãe, que ficara desfilhada, amparou-a com o discípulo amado,
ao dizer: “Mulher, eis aí teu filho.” E para que nada da Escritura ficasse por
cumprir a seu respeito, disse: “Tenho sede” e humanamente bradou: “Deus meu,
Deus meu, por que me desamparaste?” Depois de tomar o vinagre, percebendo que
estava próximo o fim e que tudo a que se propusera estava concluído, clamou com
grande voz: “Está consumado. Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito.”
Porquê
a cruz? Através dela toda a terra foi regada com sangue divino e ao terceiro
dia o Lírio dos Vales, Rosa de Sharon, de novo brotou e o mundo tenebroso
encheu-se de flores e, ainda que Cristãos muito falhos, somos para Deus o bom
cheiro de Cristo (2 Coríntios 2:16).
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