quinta-feira, 17 de abril de 2014

A Ceia do Senhor

“Santa Ceia”, “Comunhão”, “Ceia do Senhor”, são algumas das designações usadas para definir aquilo a que alguns também chamam de “Sacramento do Altar”. Não me preocupa os termos usados para descrever este memorial, mas sim aquilo que se crê a respeito dele e a forma como o praticamos.
Na minha opinião é lamentável e muito preocupante que, em nosso tempo, estejamos tão aquém das expectativas de Deus no que diz respeito à instituição eucarística de Cristo. Toda a sua vida foi em função do sacrifício expiatório. Disse Jesus: “Desejei muito comer convosco esta Páscoa antes que padeça” (Lucas 22:15). Algum tempo antes de estabelecer a ceia, Jesus proferiu um discurso que alguns discípulos classificaram de muito duro e insuportável de se ouvir: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo. Quem come a minha carne, e bebe o meu sangue, tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne, e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele.” (João 6:51-56).
Há quem não relacione este texto das Escrituras com a instituição eucarística, mas creio estarem profundamente ligados, como podemos observar na última ceia. Jesus tomou o pão e disse: “Tomai e comei, isto é o meu corpo”. Depois, pegando no cálice, disse: “Bebei dele todos; porque isto é o meu sangue.” O Senhor afirmou de forma enfática: “Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos.” (João 6:53).
Tudo aquilo que nos é dado a conhecer nas Escrituras leva-nos a crer que a Ceia do Senhor é algo demasiado sério para que seja praticado de forma, por vezes, leviana e, em muitos casos, inadequada. Na noite em que foi traído, Jesus tomou pão e ofereceu corpo, tomou vinho e ofereceu sangue. No entanto, domingo após domingo, os sacerdotes oferecem unicamente corpo aos seus leigos, ficando o verdadeiro e completo sacramento só para eles, visto que têm exclusividade sobre o vinho, contrariando desta forma a ordem de Jesus: “Bebei dele todos.” O sacramento só é real quando correctamente ministrado. Por outro lado, existem alguns grupos de Cristãos que usam correctamente os elementos pão e vinho, mas negam a presença real do corpo e sangue do Senhor, por se tratar apenas de uma ordenança e um memorial. Compreendo que para a nossa mente humana e carnal seja difícil aceitar que o corpo e o sangue de Jesus possam estar presentes na celebração eucarística, mas naquilo em que a nossa razão é contrariada é uma boa oportunidade para fazermos uso da fé.
Pode alguém questionar: “Como podemos ter hoje comunhão com o corpo e sangue do Senhor se ele já morreu há tanto tempo?” Se os discípulos tomaram corpo e beberam sangue, mesmo antes que Jesus fosse sacrificado, muito mais nós, uma vez que Cristo já foi morto. Isto é um mistério que pertence a Deus, o qual devemos aceitar e não deturpar, dando a entender que os elementos são apenas símbolos e que o acto é apenas um memorial e nada mais. O apóstolo São Paulo escreve o seguinte: “Falo como a entendidos; julgai vós mesmos o que eu digo. Porventura o cálice de bênção que abençoamos não é a comunhão do sangue de Cristo? O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo?” (1 Coríntios 10:16).
Estava certo dia a conversar com um membro de uma igreja ortodoxa, quando ele disse algo que me deixou a pensar e que se tornaria para mim na definição mais simples e compreensível do que é o sacramento do altar: “Na mesa do Senhor existem quatro elementos: pão, vinho, corpo e sangue.” Isto está em perfeita harmonia com a citação do apóstolo S. Paulo atrás mencionada. No século XVI o Dr. Martinho Lutero dizia que junto com o pão e o vinho tínhamos real comunhão com o corpo e sangue de Cristo.
Sou apenas um leigo e não pretendo ser juiz de ninguém, muito menos da Igreja do Senhor. Apenas me deleito em meditar na Sua Palavra que é “lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho” (Salmos 119:105). Também é “viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante de Deus; antes, todas as coisas estão nuas e patentes, aos olhos daquele a quem temos de prestar contas.” (Hebreus 4:12,13).
A igreja Cristã do presente tem subestimado em larga escala o valor eucarístico da ceia, quase à semelhança do que acontecia na igreja de Corinto, conforme lemos na carta que Paulo lhes escreveu: “Nisto, porém, que vou dizer-vos não vos louvo; porquanto vos ajuntais, não para melhor, senão para pior. Porque antes de tudo ouço que, quando vos ajuntais na igreja, há entre vós dissensões; e em parte o creio. E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós. De sorte que, quando vos ajuntais num lugar, não é para comer a ceia do Senhor. Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome e outro embriaga-se. Não tendes porventura casas para comer e para beber? Ou desprezais a igreja de Deus, e envergonhais os que nada têm? Que vos direi? Louvar-vos-ei? Nisto não vos louvo. Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; E, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o novo testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha. Portanto, qualquer que comer este pão, ou beber o cálice do Senhor indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor. Por causa disto há entre vós muitos fracos e doentes, e muitos que morrem.” (1 Coríntios 11:17-30).

A ceia do Senhor é toda ela envolta em mistério e riqueza espiritual, sendo um memorial e, ao mesmo tempo, palavra viva e alimento que aumenta a nossa fé, trazendo remissão de pecados, conforme Mateus 26:28. Acho que deveríamos aproveitar esta época quaresmal para reflectirmos profundamente sobre aquilo em que cremos e praticamos, examinando-se cada um a si mesmo, e apelo em especial aos líderes religiosos, que maior responsabilidade têm, para que não entrem em condenação e sejam culpados do corpo e do sangue do Senhor.


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